Cigarras
Todos conhecem a fábula da cigarra e da formiga. A sua versão mais antiga é de Esopo, mas tem vindo a ser recontada vezes sem conta, nas mais diversas versões. A moral, essa, permanece, aparentemente, sempre a mesma: a cigarra só se quer divertir, só pensa no momento presente e, por isso, acaba por hipotecar o seu futuro; a formiga, por seu lado, é previdente e assegura o porvir com o trabalho de agora. A cigarra é insensata; a formiga é prudente. A formiga é admirável pela sua inteligência, a cigarra é lamentável pela sua insensatez. Mas esta está longe de ser a minha história favorita que envolve cigarras. Prefiro mil vezes a de Platão, na qual as cigarras fazem muito melhor figura. A cena é magnífica. Sócrates e Fedro passaram a manhã inteira a ler e a fazer discursos sobre Eros, deitados na relva, sob uma árvore frondosa, à beira de um riacho de águas cristalinas. Chega o meio-dia e a discussão envereda para a investigação do que significa fazer um discurso belo. Mas o calor e a preguiça ameaçam liquidar a conversa.
«Sócrates - Parece-me que também as cigarras, cantando sobre as nossas cabeças, na força do calor, nos observam conversando um com o outro. Se elas vissem que também nós os dois, como a maioria das pessoas, não conversávamos ao meio-dia, mas dormíamos a sesta e ficávamos fascinados, por preguiça da mente, por elas, muito justamente fariam chacota de nós, julgando que éramos escravos que tinham vindo até ao abrigo delas, como cordeirinhos que passam o meio-dia a dormir em volta da fonte. Porém, se nos virem a conversar e a navegar, não seduzidos, ao largo delas, como se fossem Sereias, o prémio que receberam dos deuses para dar aos homens logo, tomadas de admiração por nós, no-lo concederiam.
Fedro - Mas que é isso que elas têm? Pois isso é algo que me parece nunca ter ouvido falar...
Sócrates - Não fica bem que um homem que ama as Musas não tenha ouvido falar disto. Diz-se que antigamente, antes do nascimento das Musas, as cigarras eram homens, mas, tendo as Musas nascido e tendo aparecido o canto, de tal modo alguns dos homens foram fulminados pela sua doçura que, cantando, descuraram a comida e a bebida, e, sem se aperceberem, acabaram por morrer. Destes depois surgiu a raça das cigarras, que recebeu este dom das Musas: existirem sem precisarem de sustento, mas sem alimento e sem bebida logo cantar até à morte; e, depois disto, indo para juntos das Musas, anunciar-lhes quais dos homens daqui as veneram. Assim, a Terpsícore tornam-na mais benevolente, anunciando-lhe aqueles que a têm venerado nos coros; a Érato, aqueles que a veneram no amor; e às outras do mesmo modo, de acordo com o modo de veneração adequado a cada uma delas. A Calíope, a mais velha, e à que veio a seguir, Urânia, anunciam aqueles que vivem na filosofia e que veneram a sua música, pois estas são as Musas que, ocupando-se do céu e dos pensamentos divinos e humanos, cantam com a mais bela voz. Portanto, por muitos motivos devemos falar e não dormir ao meio-dia.
Fedro - Pois então falemos.»
(Platão, Fedro, 258e-259d; tradução minha)
E sim, eu tenho uma simpatia especial pelas cigarras...
«Sócrates - Parece-me que também as cigarras, cantando sobre as nossas cabeças, na força do calor, nos observam conversando um com o outro. Se elas vissem que também nós os dois, como a maioria das pessoas, não conversávamos ao meio-dia, mas dormíamos a sesta e ficávamos fascinados, por preguiça da mente, por elas, muito justamente fariam chacota de nós, julgando que éramos escravos que tinham vindo até ao abrigo delas, como cordeirinhos que passam o meio-dia a dormir em volta da fonte. Porém, se nos virem a conversar e a navegar, não seduzidos, ao largo delas, como se fossem Sereias, o prémio que receberam dos deuses para dar aos homens logo, tomadas de admiração por nós, no-lo concederiam.
Fedro - Mas que é isso que elas têm? Pois isso é algo que me parece nunca ter ouvido falar...
Sócrates - Não fica bem que um homem que ama as Musas não tenha ouvido falar disto. Diz-se que antigamente, antes do nascimento das Musas, as cigarras eram homens, mas, tendo as Musas nascido e tendo aparecido o canto, de tal modo alguns dos homens foram fulminados pela sua doçura que, cantando, descuraram a comida e a bebida, e, sem se aperceberem, acabaram por morrer. Destes depois surgiu a raça das cigarras, que recebeu este dom das Musas: existirem sem precisarem de sustento, mas sem alimento e sem bebida logo cantar até à morte; e, depois disto, indo para juntos das Musas, anunciar-lhes quais dos homens daqui as veneram. Assim, a Terpsícore tornam-na mais benevolente, anunciando-lhe aqueles que a têm venerado nos coros; a Érato, aqueles que a veneram no amor; e às outras do mesmo modo, de acordo com o modo de veneração adequado a cada uma delas. A Calíope, a mais velha, e à que veio a seguir, Urânia, anunciam aqueles que vivem na filosofia e que veneram a sua música, pois estas são as Musas que, ocupando-se do céu e dos pensamentos divinos e humanos, cantam com a mais bela voz. Portanto, por muitos motivos devemos falar e não dormir ao meio-dia.
Fedro - Pois então falemos.»
(Platão, Fedro, 258e-259d; tradução minha)
E sim, eu tenho uma simpatia especial pelas cigarras...
4 outras Irrelevâncias:
Nao gosto de cigarras. Há delas muito perigosas =P
Não percebo a quem te possas estar a referir... :P
Nem queiras saber. Há cigarras muito ardilosas. Conselho de amigo: quando vires uma FOGE! =P
Eu gosto de ser cigarra de dia e formiga à noite *
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