sábado, 21 de julho de 2007

Paixões Helénicas



“Deverei eu então agora dizer”, disse Critóbulo, “com que fundamentos me orgulho da beleza?”

“Sim”, disseram eles.

“Se eu então não for belo, como julgo, vocês deveriam ser punidos por fraude: pois, sem que ninguém vo-lo peça, sempre jurando afirmam que sou belo. Eu pela minha parte acredito em vocês, pois considero-vos homens nobres e bons. Mas, se eu sou realmente belo e se vocês sentem em relação a mim o mesmo que eu sinto em relação àquele que considero ser belo, juro por todos os deuses que não tomaria o poder do rei [dos Persas] em vez da beleza. Porquanto agora eu ver Clínias é mais doce do que ver todas as coisas consideradas belas pelos humanos. Aceitaria mais ser cego para todas as outras coisas do que sê-lo apenas para Clínias. Sinto-me oprimido durante a noite e durante o sono porque não o vejo; sinto a maior gratidão para com o dia e o sol porque me revelam Clínias. É adequado para nós os belos orgulharmo-nos por causa disto: enquanto que o forte tem de adquirir bens trabalhando arduamente, e o corajoso, correndo riscos, e o sábio, falando, o belo, por seu lado, consegue tudo permanecendo em descanso. De qualquer modo, ainda que eu saiba que a riqueza é uma doce aquisição, mais doce seria dar o que tenho a Clínias do que receber mais coisas de outro, e mais doce seria ser escravo do que ser livre, se Clínias quisesse ser meu senhor. Pois seria mais fácil trabalhar arduamente para ele do que descansar, e seria mais doce arriscar-me por ele do que viver em segurança. Assim, Cálias, se te orgulhas de ser capaz de fazer as pessoas mais justas, eu mais justamente do que tu guio os homens em direcção à excelência. Pois por causa de uma certa inspiração nós os belos tornamos os apaixonados mais generosos no que diz respeito à riqueza, mais esforçados e desejosos da glória nos perigos, e mais modestos e controlados, pois daquilo de que mais sentem mais falta, disso mesmo mais sentem vergonha. São loucos aqueles que não escolhem os belos para serem generais. Eu, de qualquer modo, atravessaria o fogo com Clínias, e sei que vocês fariam o mesmo comigo. Por isso, não te interrogues mais, ó Sócrates, se a minha beleza trará algum benefício aos homens. E também não penses mais que a beleza é desprezível porque depressa passa o seu auge, uma vez que, do mesmo modo que o rapaz é belo, assim também o são o jovem, e o adulto e o velho. É sinal disto o seguinte: são escolhidos para serem portadores dos ramos de oliveira para Atena os velhos mais belos, assim sendo acompanhadas todas as idades pela beleza. Além disso, se é doce conseguir aquilo que se quer com a boa vontade daquele que dá, bem sei que mais depressa em silêncio convenceria este rapaz ou esta rapariga a beijar-me do que tu, ó Sócrates, por mais longa e sabiamente que falasses.”

(Xenofonte, Symposium, 4.10.2 - 4.19.1; tradução minha)

1 outras Irrelevâncias:

Musicologo disse...

Aos belos, o mundo cai-lhes aos pés...

Mas... a beleza tem-se, conquista-se ou induz-se nos outros?...