sábado, 1 de dezembro de 2007

Reflexões palacianas

Não deixa de ser irónico: o palácio que costuma servir de palco às cerimónias protocolares da Presidência da República nunca foi acabado - por falta de fundos. Não contamos actualmente com mais do que um terço do projecto inicial e mesmo esse terço deixa bastante a desejar. Não quero dizer com isto que se trata de um palácio feio e sem encantos. Tem-nos e muitos, no seu interior, sobretudo aquelas salas que nos deixam vislumbrar as régias personagens que os habitaram, por detrás de toda a pompa. Mas é um exercício melancólico - atravessar salas e salas cheias de mobiliário e de adornos e adereços e tentar, nem que seja por um instante, reconstituir na imaginação o que tenha sido a vida daqueles que as povoaram. Ver um museu como o Museu do Palácio da Ajuda é como caminhar por uma cidade deserta: o mais que vemos é ausência. Será assim, talvez, com todos os museus e, ainda mais, com aqueles museus que procuram reconstituir a vida dos que viveram outrora. São monumentos no sentido pleno da palavra: fazem recordar os que estão ausentes. Mas na Ajuda esse sentimento parece ser ainda mais forte. É como um cemitério, mas mais húmido e menos arejado. Era preciso que, chegando um dia de Primavera, alguém abrisse aquelas janelas e deixasse entrar o sol e o ar. Era preciso que alguém, de algum modo lhe desse vida. Mas a Ajuda não é aquilo que deveria ter sido, é um mero fragmento de si.

E assim chegamos à maior ironia de todas: que o próprio palácio que serve de sede ao Ministério da Cultura se encontre num estado tão aquém daquilo que deveria ter sido. Não proponho, obviamente, que completem os projectos originais, pois isso seria uma obra faraónica e sem grande préstimo hoje em dia. Aquele palácio tem potencialidades para ser um grande foco de atracção para todos e o centro gravitacional de toda aquela zona. Merecia estar mais próximo de todos, em vez de estar perdido nos longes daquele monte. Merecia que toda a zona envolvente fosse reabilitada. Merecia que as suas salas fossem restauradas. Merecia, em suma, que os seus espaços fossem libertados para servirem, não já de habitação para a realeza, mas de local de lazer e educação de todos os cidadãos. E, claro está, como sede protocolar digna desse nome: uma cujas degradadas traseiras não nos envergonhassem.

(Esta parte até é engraçada... Mas haviam era de ver como é a parte de trás daquela parte incompleta. É de fazer inveja ao maior monte de entulho deste país...)

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